Pretérito imperfecto

unas

Las uñas de Anibel tienen el esmalte corrido por la espera. Ojos fijos en la esquina. Idea fija en planes bien estructurados, lavados con agua y desinfectante. Nada podría salir errado. No escogió mucho la ropa que llevaba aquella noche, pero escogió cada palabra que debería ser dicha, todas mohosas, guardadas en el cajón hace meses. Intoxicada, su odio acumuló grados de fiebre. Anibel tiene uñas pequeñas y mal hechas.

Anibel es pretérito imperfecto. Su fiebre tiene nombre y no quiere repetirlo. Era tan joven y vivía soñando un gran amor. Trabajaba mucho todos los días y siempre creía que en aquel día que amanecía algo especial podría ocurrir. Siempre con esperanza verde, como lodo en una fuente. Siempre esperando un afecto, como gata abandonada. Hoy, él no va a huir. Ojos fijos en la esquina. Ideas fijas en la cabeza. Hoy ella no va a ahogarse en el mar del fracaso y del desorden. Hoy no. Ya cruzó la pierna a la derecha y a la izquierda innúmeras veces. El maxilar le duele en la tensión del encuentro.

Última y única vez que en su pretérito imperfecto él la haría mal. Fue terrible aquel encuentro. Siente el sabor del alcohol en la boca hasta hoy. No sabía lo que hacía, o sabía, o no sabía, o quería, o tal vez fuera mejor haber recusado. Fue una trampa. Fue terrible. Fue en el cuarto de baño detrás de la casa. Y nadie sabe lo que él hizo con ella. Quería tanto un gran amor. Tropezó en la trampa infecta. Anibel quiere lavar la mente y el alma con agua y desinfectante. Es tarde. Pero ella aprendió sobre sus pasos. Las calles que él recorre todos los días. Está sumido últimamente, pero Anibel no desistirá. Tiene razones fúnebres, de fiebre amarilla, de gata abandonada, de mujer de uñas corroídas. No va a salir de la silla de aquel bar  inmundo hasta que él doble la esquina. Hoy ella no va a desistir. Hoy ella no va a dejar todo para mañana. Hoy ella no va a salir corriendo con las piernas temblando. Hoy no.

En el pretérito imperfecto de Anibel corren ríos de desistimiento. Su carne es flaca. No sabe tomar decisiones. Luego después de lo que pasó en el cuarto de baño detrás de la casa, su vida no fue más la misma. Él sumió y no dio noticias. Ella, deseando un gran amor, ve ahora una pelota de nieve. Nadie sabe, ni sus amigos, ni los parientes, ni él. Ya pasaron siete meses. Doblándose sobre la barriga no se puede esconder lo que Anibel va a enfrentar. Ya está atrasado dos horas y cuarenta y cinco minutos. Él sumió. El esmalte de las uñas de Anibel también.

Pretérito imperfeito

As unhas de Anibel têm os esmaltes corroídos pela espera. Olhos fixos na esquina. Ideia fixa em planos muito bem arquitetados, lavados com água e desinfetante. Nada poderia sair errado. Não escolheu muito a roupa que colocou para sair aquela noite, mas escolheu cada palavra que deveria ser dita, todas mofadas, guardadas na gaveta há meses. Intoxicada, com o espinho de tucunaré atravessado na garganta. Seu ódio acumulou graus de febre nos últimos meses. Prestes a estourar como balão de festa. Anibel tem unhas pequenas e malfeitas. Anibel só tem pretérito imperfeito. Sua febre de meses tem nome e ela nem ousa repeti-lo. Era tão jovem e vivia sonhando um grande amor. Trabalhava muito todos os dias e sempre achava que naquele dia que amanhecia algo especial pudesse acontecer. Sempre na esperança esverdeada, como lodo em chafariz. Sempre esperando um afeto, feito siamês abandonado. De hoje ele não escapa. Olhos fixos na esquina. Ideias fixas na cabeça. Hoje não vai se afogar na maré do fracasso e da desordem. Hoje não! Já cruzou a perna para a esquerda e para a direita inúmeras vezes. O maxilar dói na tensão do encontro.
Última e única vez em seu pretérito imperfeito em que aquele  malnascido a faria mal. Foi terrível aquele encontro. Sente o gosto de álcool na boca até hoje. Não sabia o que fazia, ou sabia, ou não sabia, ou queria, ou talvez fosse melhor ter recusado. Foi uma armadilha. Foi medonho. Foi no banheiro dos fundos e ninguém sabe o que ele fez dela lá. Queria tanto um grande amor. Tropeçou na armadilha infecta. Anibel quer lavar a mente e a alma com água e desinfetante. É tarde. Mas ela aprendeu a decorar os passos dele. As mesmas ruas que ele percorre todos os dias. Anda sumido ultimamente, mas Anibel não desistirá. Tem motivos fúnebres, de febre amarela, de gata siamesa abandonada, de mulher de unhas roídas. Não sairia daquela cadeira daquele boteco imundo até ele dobrar a esquina.   Hoje ela não vai desistir. Hoje ela não vai deixar para amanhã. Hoje ela não vai sair correndo com as pernas pesadas em tremedeira, em febre de malária. Hoje não.

No pretérito imperfeito de Anibel correm rios de desistência e covardia. A sua carne é fraca, mole, com varejeiras. Não sabe tomar decisões, ter pulso firme. Logo depois do acontecido no banheiro dos fundos, sua vida não foi mais a mesma. Ele sumiu e não deu notícias. Ela, à espera de um grande amor, deu de cara com uma bola de neve. Ninguém sabe, nem amigos e nem parentes, muito menos ele. Já se passaram sete meses. Nem se curvando sobre a barriga dá para esconder o que Anibel tem pela frente. Já está atrasado duas horas e quarenta e cinco minutos. Ele anda sumido. O esmalte das unhas de Anibel também.

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